sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Um juiz e seus (lamentáveis) juízos

Reproduzo trechos da matéria da Folha de hoje sobre um processo de jogador "acusado de ser homossexual".
Há muitas questões envolvendo esse universo da bola. Mas o mais assustador foi o despacho do juiz.

"Futebol é varonil, não homossexual"
Juiz rejeita queixa-crime de Richarlyson e escreve que "esta situação, incomum, do mundo moderno, precisa ser rebatida"

Depois de gerar polêmica no futebol, o episódio que envolve o são-paulino Richarlyson e o diretor administrativo do Palmeiras, José Cyrillo Jr., ganhou contornos mais agudos na Justiça. A queixa-crime apresentada pelo volante contra o cartola foi arquivada pelo juiz Manoel Maximiano Junqueira Filho, que, em sua sentença, classifica o futebol de "jogo viril, varonil, não homossexual". O jogador foi à Justiça após o dirigente citar o seu nome ao responder uma pergunta sobre homossexualismo no futebol em programa da TV Record.
(...)
No documento, o juiz sugere que, se [o atleta] fosse homossexual, "melhor seria que abandonasse os gramados".Em outro trecho, Junqueira Filho diz que "quem se recorda da Copa do Mundo de 1970, quem viu o escrete de ouro jogando (...) jamais conceberia um ídolo ser homossexual".A seguir, ele afirma: "Não que um homossexual não possa jogar bola. Pois que jogue, querendo. Mas forme seu time e inicie uma Federação".

Comentando o caso:
a) absurdos, preconceituosos e homofóbicos os argumentos do senhor juiz.
b) argumento de um magistrado num país que ostenta altos índices de violência contra homossexuais. É lamentável pois legitima, indiretamente, assassinatos diários contra pessoas que são vítimas por sua condição sexual. Desnecessário dizer que esses crimes raramente são punidos;
c) se fosse uma situação de morte como o juiz se pronunciaria: "melhor que não existisse"? Ou ainda, "faça o que quiser desde que as 'pessoas de bem' não vejam"; "A vítima é culpada porque provocou com seus modos 'excêntricos'?"
d) o que entende este senhor por direitos elementares das minorias? Que proposta é esta de segregação?
e) e por que neste universo da bola, supostamente varonil, não se pode abordar este tema? Por que a homossexualidade assusta tanto? Insegurança?

Liberdade à cubana

Muitas coisas interessantes aconteceram no Pan do Rio de Janeiro. Desde as emblemáticas vaias ao presidente da República, passando pelos acessos de patriotismo desvairado de alguns comentaristas esportivos, até chegar à beleza e plasticidade de alguns esportes, como a ginástica rítmica, por exemplo.

Outros esportes, para mim, poderiam nem existir. O softbol (se não fosse pelas belas atletas, eu nem saberia o que era); aquela outra modalidade que o rapaz fica pulando numa cama elástica, igualzinho eu fazia na cama de meus pais quando criança; o boliche; a peteca inglesa, e por aí vai.

O Pan também tornou patente o quanto somos (ainda) medíocres na formação de atletas. Excetuando-se algumas modalidades, como o voleibol, ainda temos muito a aprender, principalmente com os Estados Unidos.

No entanto, talvez o fato inusitado (e, de certa forma, imaginado e previsto) foi a fuga de alguns atletas cubanos durante o período dos jogos. Atletas da equipe de handebol e de boxe abandonaram a delegação cubana e meteram o pé na estrada. Teve um que veio de táxi para São Paulo. Outro, imediatamente, embarcou para a Alemanha. Todos muito aliviados.

E nós temos que ouvir o Exmo. Fidel Castro dizer que o Brasil está se tornando outro “Estados Unidos” ao “acobertar” os dissidentes. Caduquice tem limites, Sr. Castro!

Os atletas fugiram única e exclusivamente em busca de algo que eles consideraram que lhes faltava em Cuba: liberdade. A liberdade de poder fazer as escolhas profissionais, de ir e vir dentro e fora da Ilha, de jogar em outros países sem ser visto como “traidor do regime”, de enriquecer e ter fama.

Só essa busca pela liberdade é que pode justificar a deserção do principal boxeador cubano, Guillermo Rigondeaux (foto), que gozava de uma série de regalias e tinha uma pequena fortuna (sem falar do mar caribenho), mas escolher largar tudo e fugir, durante o Pan, para a fria Alemanha.

A lógica é simples: antes o frio e o desafio – ao sabor da liberdade – do que regalias, sol, mulheres e seguranças, com uma “liberdade à cubana”. Se for assim, à cubana, para mim, só o filé.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Conta-gotas da semana

Posts de uma semana cheia

1) Chaui falou...

A professora Marilena Chaui falou ao site do Paulo Henrique Amorim (http://conversa-afiada.ig.com.br/) sobre a "invenção da crise aérea". É o típico caso de uma leitora perspicaz e seus comprometimentos políticos para fazer a análise.

Na entrevista oscilam interessantes observações como a "comovente cobertura dos atrasos em aeroportos" que satisfaz a classe média, a ignorância total da mídia para outros temas e demoras, como no INSS, e a teoria de uma "invenção da crise".

Partindo de um repertório de sua consagrada carreira, o do "discurso competente", a professora desqualificou a crise. Para ela os "especialistas" se revestem de autoridade para tecer comentários, julgar e definir a compreensão das pessoas sobre os processos envolvidos.

Também refere-se ao tema da ideologia e seus encobrimentos.

Não há como não concordar com muitos aspectos de sua observação sobre a cobertura da imprensa. Da mesma forma que é impossível não reconhecer os esforços da filósofa para construir uma outra versão e ficarmos assustados com a sua sugestão de que o governo deveria tomar a rede nacional e explicar "a verdade".

O que me interessa nesse caso é refletir sobre a autonomia do pensamento e os compromissos políticos assumidos. De defender os governos ou de culpá-los previamente e exclusivamente.



2) As revelações da caixa-preta

A cada nova informação o governo fica mais aliviado. Um show de horrores e de julgamentos rápidos.



3) O Marco Aurélio Garcia

Não tinha comentado sobre o "top, top, top" do assessor de Lula. Uma coisa simples a ser observada: comportamento de quem conta com a complacência e a impunidade a que estamos habituados.



4) O Cansei

Inacreditável o movimento constestatório que surgiu em Campos do Jordão. A melhor tirada, temos que reconhecer, é do ex-governador Lembo, o mesmo da "elite branca": é um "movimento de dondocas".



5) O movimento apolítico

Só mesmo o bacharel da linhagem do D'Urso, presidente da OAB-SP, para dizer que o movimento é apolítico. Pelo visto, faltou mesmo no curso do advogado a leitura dos clássicos da política.



6) Chegou Agosto

O ano vai ladeira abaixo. SP não foi muito feliz: janeiro, cratera do metrô; abril, teve Bush; maio, o papa; julho, o acidente da TAM. E no resto do tempo os seres de sempre.

terça-feira, 31 de julho de 2007

Morreu Antonioni

A bruxa está solta no mundo do cinema. Depois de Bergman, agora morreu Antonioni.

Do Estadão.com

ROMA - Michelangelo Antonioni, um dos cineastas mais famosos e influentes da Itália, morreu aos 94 anos, informaram nesta terça-feira, 31, autoridades municipais de Roma. As causas não foram divulgadas, mas segundo declaração da esposa do diretor, a atriz Enrica Fico, ao jornal La Repubblica, ele morreu tranqüilamente em sua casa, em Ferrara, na noite de segunda-feira.
Considerado o pai cinematográfico da alienação e angústia modernas, Antonioni teve uma carreira de seis décadas, que incluiu clássicos como Blow-up - Depois Daquele Beijo e A Aventura.

"Com Antonioni, não se perdeu somente um dos maiores diretores vivos, mas também um mestre da tela moderna", afirmou o prefeito de Roma, Walter Veltroni. Antonioni morreu no mesmo dia em o cinema perdeu o lendário diretor sueco Ingmar Bergman, aos 89 anos.

Os filmes deliberadamente lentos e oblíquos de Antonioni nem sempre agradavam ao público, mas obras como A Aventura tornaram-no um ícone entre diretores como o norte-americano Martin Scorsese, que o descrevia como um poeta com uma câmera.


Para os cinéfilos, segue o trailer de “Blow-up – Depois Daquele Beijo”, de 1966.

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Saneamento Básico

Ontem fui assistir ao novo trabalho do diretor e roteirista Jorge Furtado, “Saneamento Básico, o filme”.

Gostei.

O interesse da platéia pela história a ser narrada é despertado já no início da trama, com a tela ainda escura, quando o filme dialoga com o espectador e o convida a participar da “reunião”.

Lançando mão de uma solução metalingüística, Furtado apresenta um roteiro com múltiplas possibilidades de leitura.

É possível pensar desde a própria produção cinematográfica, com os seus meandros burocráticos, problemas financeiros e impasses éticos e estéticos, até os limites da ficção e sua relação com o real, apresentados na película de forma inteligente a partir das discussões sobre o significado da palavra “ficção”.

Um pouco diferente dos últimos trabalhos de Furtado, Saneamento Básico contém uma crítica aos jogos que envolvem a produção (no sentido amplo) de um longa-metragem e, ao mesmo tempo, uma certa “declaração de amor” ao ato de fazer cinema.

As várias personagens presentes na trama evidenciam, cada qual à sua maneira, os desafios, paixões, ilusões e instâncias que giram em torno da criação da “obra final”.

Desde a idéia e direção iniciais (Marina), passamos ao longo da história: pelos problemas colocados pelo “olhar do espectador parcialmente ingênuo” (Joaquim), pelos responsáveis por questões técnicas que não entendem lá essas coisas de filmagem (Fabrício), pelo sucesso relâmpago das atrizes (Silene ‘Seagal’) até chegar à figura do “diretor final” (Zico), que tem o traquejo político e “domina” a linguagem da produção cinematográfica.

Vale a pena assistir. Boa história, ótimo elenco, com uma bela trilha sonora à italiana!

Marina Lima no Conta-Gotas

Na seção "Vídeo da Semana", apresentamos: Marina Lima. Escolha do editor Zé Alves, o clipe de "Criança", via MTV, transborda anos 80.


Quem quiser conferir, é só clicar nas telinhas P/B, lá no rodapé da página.

Morreu Bergman

Os demônios, que tanto atormetaram Bergman, agora o esperam chegar!
Da Reuters (30/07/2007)
ESTOCOLMO (Reuters) - O lendário cineasta sueco Ingmar Bergman, que influenciou gerações de cinéfilos com suas obras sombrias sobre temas como a morte e os tormentos sexuais, morreu nesta segunda-feira, aos 89 anos.

Sua filha Eva disse à agência sueca de notícias TT que o diretor e roteirista autodidata morreu em sua casa, na ilha de Faro, no mar Báltico.

Entre seus filmes mais conhecidos estão "Morangos Silvestres", "Cenas de um Casamento" e "Fanny e Alexander", vencedor de quatro Oscars. Esses filmes ajudaram a tornar a Suécia mundialmente associada à melancolia, mas fizeram de Bergman um mestre do cinema mundial.

Ao longo da carreira, ele realizou 54 filmes, 126 produções teatrais e 39 peças de rádio, além de programas para TV.

Suas obras-primas frequentemente lidavam com a confusão sexual, a solidão e a vã busca pelo sentido da vida - temas que muitos atribuíam a uma infância traumática, quando ele era agredido pelo pai.

A vida particular de Bergman também costumava colocá-lo sob os holofotes. Casou-se cinco vezes, com mulheres bonitas e talentosas, e teve relacionamento com suas principais atrizes.

Em 2001, disse à Reuters, numa rara entrevista, que seus demônios pessoais haviam atormentado e inspirado sua vida inteira.

"Os demônios são inumeráveis, aparecem nos momentos mais inconvenientes e criam pânico e terror", disse Bergman na época. "Mas aprendi que, se eu puder dominar essas forças negativas e colocar arreios nelas, elas podem funcionar em meu benefício."

Em 1956, Bergman obteve reconhecimento internacional com "O Sétimo Selo", no qual está a clássica cena em que o cavaleiro medieval, à procura de Deus e do sentido da vida, joga xadrez com a morte. No ano seguinte, o filme recebeu o prêmio do júri em Cannes.

Bergman se estabeleceu na ilha Faro ("das ovelhas"), na costa sudeste da Suécia, depois de rodar sete filmes ali. Todos os verões, a ilha celebra a vida e obra de Bergman.

domingo, 29 de julho de 2007

O Pan das vaias


Terminaram os Jogos Pan-Americanos Rio 2007.

Análises de resultados à parte, que deixo aos inúmeros analistas do mundo esportivo, este foi o Pan da vaia.

Não me refiro apenas àquelas dirigidas ao Lula.

Durante as competições a quantidade de vaias aos integrantes de delegações de outros países era gigantesca. Os atletas estrangeiros eram duramente "secados" com as vaias da torcida brasileira.

Este comportamento, principalmente nos esportes individuais, foi criticado pelos atletas brasileiros e estrangeiros.

Diante disso só nos resta uma triste constatação: o público do Pan não gosta do esporte, gosta é de ganhar. Não interessa se um ginasta, um fundista ou um arremessador tenha méritos, se não é do país não conta. A aposta era atrapalhar a concentração.

Triste ver essa constatação. Talvez sejam os tantos anos de monopólio futebolístico e a hipótese de que "torcida ganha jogo". Talvez seja apenas a insegurança e a carência dos brasileiros.

Mas tendo a pensar que, mesmo numa competição que teve tantos recursos e baixo nível técnico, o "orgulho de ser brasileiro" se confunde com a grosseria e a vontade de se dar bem acima de tudo.