Num dia de feriadão, a cidade vazia, com ruas e restaurantes mais calmos pude reler um texto breve de Epicuro, a Carta a Meneceu (ou Carta sobre a felicidade, Ed. Unesp).
Correndo o risco de transformar uma reflexão mais densa em um comentário que beira a auto-ajuda há um trecho que gostaria de partilhar:
"Nunca devemos nos esquecer de que o futuro não é totalmente nosso, nem totalmente não-nosso, para não sermos obrigados a esperá-lo como se estivesse por vir com toda certeza, nem nos desesperarmos como se não estivesse por vir mais".
Epicuro (341-270 a.C), nesta breve sentença, parece mais contemporâneo do que nunca. Em tempos muito próximos de nós as reflexões deterministas produziram um discurso da inevitabilidade. A idéia de que a vida é imponderável apenas reforça nossa angústia e nossa responsabilidade diante de escolhas contínuas e cotidianas.
Nada esperar não significa nada fazer. Da mesma forma, invertendo a sentença, tudo fazer - prática de um discurso utilitarista - não significa obter. No intervalo entre as duas coisas espanta-se o imobilismo, a comodidade ou o desespero que agregamos ao nosso cotidiano.
Não há catástrofes nem redenções prévias: tudo por fazer, sem qualquer forma de garantia. Eis o fardo das escolhas humanas e a beleza que torna a vida única e irrepetível.
3 comentários:
Acredito que a angústia reside não no ato de decidir, mas no ato de encarar as consequências que vêm junto com as escolhas que fazemos. E aqui também, essas consequências não são imutáveis, mas sim passíveis de serem trabalhadas, para serem "consertadas" ou melhoradas. Por isso, concordo que não devemos aceitar o fato de que elas aconteceram e "nada mais será como antes", sem tentar mudá-las, se é isso mesmo que queremos. E concordo também que não devemos fazer tudo o que podemos a todo momento, sem nos basearmos na máxima do "um dia após o outro". Enfim, como esse mesmo texto diz, precisamos fazer "um exame cuidadoso (...) que remova as opiniões falsas em virtude das quais uma imensa perturbação toma conta dos espíritos”, e não ceder à insegurança que nos culmina nesses momentos. Insegurança: vontade de se alcançar a felicidade...
Seguindo o raciocínio sobre o Futuro, gosto da poesia de Antônio Machado:
"... não há caminho,
faz-se caminho ao andar."
E graças ao Google, a poesia completa em espanhol, está abaixo e fica bem mais incisiva:
Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
Caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.
Al andar se hace el camino,
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante no hay camino
sino estelas en la mar.
E na linha da felicidade:
"Nascemos sem pedir e morremos sem querer. Aproveitemos o intervalo" Anônimo(?)
Bom fim de semana!
"A ação antecede o projeto da vida para um fim incerto." Eu li esta carta sobre a Felicidade de Epicuro, muito boa, um passado remoto que transcende sua época nos dando exemplos para o nosso presente.
Abraços,
Raquel
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