quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Light: uma questão de gênero?

por Duda (da Cidade do México)

Ainda não me acostumei com a idéia de ter colesterol alto. Especialmente, porque ele é genético: corro pelo menos 3 vezes por semana, durmo cedo, não fumo, não bebo, como mais saladas e coisas light do que qualquer outra coisa, detesto junkie food e nunca tomei um refrigerante na vida! Nem todos os fatores citados têm a ver com colesterol alto. Talvez a minoria tenha. O que interessa, em suma, é que sou o mais quadrado personagem do mundo! Daí o fato de me incomodar com alguma coisa ruim em minha saúde. Coisa que não é bem culpa minha...

Escrevi tudo isso como preâmbulo para a situação que realmente interessa: em decorrência do colesterol, sou um grande consumidor de produtos light. E, como é inevitável, sempre olho para as embalagens enquanto consumo esses produtos. É assim que percebemos que todos eles apelam para a idéia da redução de gordura trazer consigo a redução de calorias (como se eu estivesse preocupado com isso!). Os invólucros usam, inevitavelmente, cores mais brandas e tonalidades mais amenas do que os produtos integrais. Cor light, produto light! Não raro podemos ver silhuetas de corpos esbeltos ou malhados, tanto de homens quanto de mulheres. Claro: tome leite de soja e tenha o abdômen rachado. Dessa forma, seus problemas acabam!

No México, por recomendação do cardiologista, procuro manter a dieta e o mínimo de atividade física. Toca água e produtos light para o organismo. Sendo assim, continuou da mesma forma o velho hábito de analisar as embalagens. Qual não foi a surpresa em descobrir que o único leite desnatado que achamos (semi-desnatado tem mais) em dois supermercados chama-se siluette plus, vem numa embalagem rosa e branca, com uma garota branca, magra e com cara de tédio a nos olhar. Na mesma linha de produtos, tomo um yoghurt sin grasa também rosa e que traz a equação, tal qual a do leite: buena hidratación + buena alimentación + actividad física = la mejor actidud! Uma silhueta feminina correndo e outra com os braços para trás.

Comecei a reparar em outros produtos light por aqui e a mesma coisa: se não tem gordura, logo é rosa, vermelho ou amarelo e tem uma mulher magra e loira estampada. ‘Ora’, cheguei a pensar, ‘que cara mais preconceituoso’, um homem não pode tomar um produto rosa com uma moça na “capa”? Será que a propaganda não pode também visar ao público masculino, criado sob a égide do azul, mesmo estampando apenas mulheres?

Poderia ser. Até entrar em questão o consumo de água. Já que não bebo refrigerantes, tomo toneladas de água. Mesmo assim, nunca tinha reparado em como se anunciam ou como são as embalagens de água. Sei apenas que 90% delas são de plásticos, não retornáveis. Mas neutras: rótulo branco (que, como o preto, é cor sem gênero! Ainda que carreguem suas tintas políticas...) em garrafas transparentes ou azul claras. Não anunciam nada. Talvez uma ou outra traga os possíveis benefícios à saúde de quem consome água mineral. Bebem-na homens e mulheres, mamíferos e aves, fitoplâncton e cianofíceas.

Aqui, água é da torneira! Sem problemas para os povos de Anáhuac, mas altamente desaconselhável para os forasteiros que não queiram se ver com a maldição de Montezuma! É notável o efeito da água de torneira nos intestinos dos incautos! Só por isso, aconselha-se, neste caso, não fazer como os romanos quando estiver nesta Roma. Logo, tomemos água embotellada! Na marca mais vendida por aqui, os dizeres do rótulo, raramente iguais, como os biscoitos da sorte, estampam pérolas do tipo: “para o dia a dia da princesa!”.

Aí é gozação: a única conclusão possível é que light e água de garrafa, no México, são coisas de mulher! Água e gordura têm gênero neste país do hemisfério norte! Homem que é homem que morra do coração! Viva a subjetividade do gênero! Viva meu coração y viva Zapata!

2 comentários:

Fernanda disse...

Light não é, nunca foi e nunca será uma questão de gênero, pelo menos por aqui não. Agora ao que me parece, no México as "mujeres" devem ser "guapas" enquanto os "hombres" uns "cañones".rs
Vai entender!

Tchô disse...

É algo a se pensar. Estou redigindo uma matéria sobre o assunto e acabei parando aqui neste blog. O artigo é muito interessante e me será útil para tirar inspiração. Concordo com a Fernanda, isso deve explicar o "naipe" da publicidade mexicana...