terça-feira, 29 de abril de 2008

Do lugar da desculpa na política

Qual é o lugar da desculpa na política?

Foi essa a pergunta que me fiz após ouvir Cid Gomes, governador do Ceará, pedir desculpas por ter levado sua sogra para passear de avião até a Europa.

Em tempos de cartão corporativo, chamou a atenção vê-lo pedir desculpas. O interessante é por que ele pediu desculpas: pelo constrangimento e não por ter cometido algum delito!

Como os demais políticos e reitores que protagonizaram gastos com carros alugados, tapiocas e lixeiras, Cid Gomes alegou não ter agido de má-fé e afirmou, ainda, não ter desrespeitado nenhuma lei. Afinal de contas, a sua sogra não custou nada aos cofres do Estado.

Talvez Cid Gomes não tenha infringido nenhuma lei; apenas confundiu o público com o privado, mesmo sem causar ônus para o erário.

Mas voltemos ao tema da desculpa na política! Há lugar para a desculpa na política? Qual?

Se tomar o caso do tal governador como exemplo para a reflexão, digo que há lugar sim. O pedido de desculpas público, dirigido às pessoas que o elegeram, é, a rigor, o atestado de que Cid errou e que – se esse pedido não for irônico e revestir-se de sinceridade – reconhece seu erro.

Portanto, nesses termos, pedir desculpa significa reconhecer que houve um erro – na política: sem dolo, de preferência – e submeter-se, humilde, aos outros, ao público, esperando o perdão! Pedir desculpa significa, antes de tudo, conhecer a norma.

Aí entra o artifício retórico de Cid Gomes: pediu desculpas por quê? Não houve, segundo o governador, delito algum.

Então por quê? Por ter se envolvido em um episódio que causou constrangimento. A quem? Sobretudo a ele próprio! Que coisa mais narcisista: vir a público pedir desculpas por um constrangimento que ele próprio causou a si mesmo.

Recuperando a concepção psicanalítica, ao narciso não importa necessariamente o que ele vê no espelho, mas sim como os outros o vêem. E, neste caso, pedir desculpas é uma forma de recolocar-se diante dos outros, mesmo sem admitir que errou!

Pedir desculpas na política, parece-me, é um artifício retórico que, aplicado às circunstâncias brasileiras onde a moral e a política se tocam de modo sui generis, se mostra bastante eficiente, ainda que se peça desculpas sem que exista algum erro.

Ou alega-se que não se sabe de nada; ou grita-se que não houve má-fé (portanto, outra forma de “não saber de nada”); ou então, pede-se uma “auto-desculpa”, a rigor vazia, mas eficaz no discurso político.

2 comentários:

Fernanda disse...

Imagino a cena do Governador recebendo conselhos de seus assessores "Peça desculpas, perante aos eleitores...", e ele naquela de "Mas o que eu fiz de errado?".
Seria cômico, se não fosse vergonhoso.
Me faz lembrar uma cena do filme "A Rainha", quando ela é aconselhada por Tony Blair e seus assessores a se pronunciar sobre a morte da Princesa Diana. O pronunciamento ocorreu, mas sem vontade real alguma.

Infelizmente, onde deveria haver transparência, há um teatro puro!

Anônimo disse...

Ele ficou constrangido e arrependido por ter trazido a sogra de volta!